sexta-feira, 21 de março de 2008

Na fronteira - Revista Imprensa » Edição 232 (mar/2008)



Por Rodrigo Manzano / Fotos: Pya Lima





Júnia Nogueira de Sá, Diretora de Assuntos Corporativos e Imprensa da Volkswagen do Brasil, sutilmente vem desmontando a metáfora de uma fronteira que separaria jornalistas de redação e profissionais de assessoria de imprensa. Em meio à crise de imagem que a Volkswagen enfrentou na primeira quinzena de fevereiro, demonstrou que o melhor caminho para estreitar a relação com a imprensa é abrir as portas da empresa e agir com transparência. O "Caso Fox", como ficou conhecida a denúncia de que o rebatimento do banco traseiro do automóvel teria causado acidentes aos usuários, invadiu o noticiário e acendeu o alarme da opinião pública. No plano de gestão de crise da companhia, havia a clara percepção de que o mais importante naquele momento era mobilizar quem fosse necessário - inclusive o presidente da VW, Thomas Schmall, que foi ao "Jornal Nacional" pessoalmente mostrar a segurança do procedimento - e ceder à demanda de informação provocada pelo noticiário. Diplomática, Júnia, contudo, mantém a discrição quando questionada se houve excessos por parte da mídia: limitou-se a afirmar que a cobertura, como um todo, estava recheada de "desinformação". Para reverter o quadro, comandou uma operação de guerra e guerrilhas em que o inimigo não eram os formadores de opinião, mas o alarmismo desencadeado pela cobertura em cadeia. A trajetória de Júnia pelas redações, em especial na Folha de S.Paulo, onde chegou a assumir o posto de ombudsman entre os anos de 1993 e 1994, imprime à sua relação com a imprensa uma postura um tanto sui generis, já evidenciada em cargos executivos em outras corporações, como Telefônica e Abril. A indústria automobilística corresponde, no Brasil, a 18,5% do PIB industrial, e a Volkswagen, a 23% do setor, praticamente empatada com a Fiat e GM, líderes do mercado. Trata-se, portanto, da comunicação de um setor essencial à economia e à geração de empregos, cuja pauta não se restringe ao noticiário especializado. Da rotina no jornal, Júnia não tem saudade alguma dos plantões, e reconhece que seu volume de trabalho não diminuiu ao se transferir para a comunicação corporativa. Confessa, ainda, emocionar-se com o cheiro de tinta que impregna o prédio da Folha de S.Paulo. De sua sala na Volks, em São Bernardo do Campo, não se sente aroma algum. Nem o adorável cheiro de carro novo nem o de oficina. IMPRENSA - O caso Fox - que se abateu sobre a Volkswagen em fevereiro - foi cercado de elementos muito favoráveis ao alarmismo, como dedos mutilados e a suspeita de que os carros brasileiros eram menos seguros que os europeus, a ponto de o presidente da companhia ir à televisão mostrar que o sistema é seguro. Você acha que houve algum exagero por parte da mídia? Júnia Nogueria de Sá - O tamanho dessa cobertura foi o tamanho da Volkswagen. Eu não consigo imaginar a mesma dimensão em outras montadoras menores. A Volkswagen é um ícone no Brasil, e um caso como esse ganha uma grande dimensão. Estamos falando do 4º carro mais vendido no país, e o fato de que esse caso agrega alguns símbolos bastante chamativos deu essa dimensão. Infelizmente, o que se vê na imprensa é uma grande desinformação. Diversas reportagens foram preparadas sem que o repórter tivesse procurado saber a realidade, inclusive a acusação de que os carros exportados para a Europa são diferentes dos vendidos no mercado brasileiro. Há dois fatos que sistematicamente geram noticiário sobre as companhias automobilísticas: recall e negociação sindical. Como a Volkswagen lida com essas questões e qual delas dá mais trabalho? Na verdade, existem duas frentes bastante distintas na comunicação, que se confundem em vários momentos: produto e institucional. A minha primeira providência na Volkswagen foi juntar as duas equipes em um mesmo espaço físico e tentar fazer com que a interação fosse a maior possível, exatamente para fazer com que as informações fluíssem e nosso trabalho ficasse mais consistente. A troca de atributos é muito benéfica, não tem por que separar. Sabendo que alguns casos de acidentes já eram conhecidos há pelo menos dois anos, a que você atribui o ressurgimento da matéria na pauta? O primeiro caso que surgiu, de um cliente da Volkswagen de São José dos Campos, foi publicado na Quatro Rodas em 2006 e acabou sendo levado de volta aos jornais agora, sempre pelo próprio cliente. Ele tem uma ação na Justiça contra a Volkswagen e, sem dúvida, compreende a força da opinião pública e tenta mobilizá-la para a sua causa. Essa história retornou à pauta na revista Época e na TV Bandeirantes no carnaval, e o potencial de desaparecer era grande. Na quinta-feira, o Estadão publicou uma matéria. Já não era mais carnaval, as atenções estavam focadas na vida real e as pessoas já tinham voltado do seu recesso. A soma dessas três mídias fez com que o assunto ganhasse uma enorme dimensão e crescesse. Que erro a Volks não pode se dar ao luxo de cometer, tanto no relacionamento com a imprensa, quanto no relacionamento com seus consumidores? O maior erro em qualquer momento é fechar as portas. O tradicional seria esperar o pronunciamento da Justiça, mas tratamos a opinião pública como ela merece. A Volkswagen tem uma relação de proximidade com os brasileiros. O cliente e o cidadão acabam se confundindo, e nessa hora estamos pensando no cidadão, na sociedade. As portas estão abertas. Os executivos, no entanto, são muito refratários aos jornalistas, ainda... Ainda há muitos executivos refratários. A Volkswagen, hoje, conta com um presidente que, além de jovem, tem uma visão muito arejada do que seja a opinião pública e da importância dela. Ele e sua equipe já lidaram com muitos lançamentos de produtos, com muitos recalls e tiveram muitas interações com a opinião pública, suficientes para compreender a importância disso.

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